A trajetória artística de Thayná Lins é marcada por superação, sensibilidade e um reencontro consigo mesma por meio da arte. Embora sua história na pintura tenha começado apenas em 2021, o caminho que a levou até ali é profundo e cheio de significados. Em 2018, aos 23 anos, sua vida mudou drasticamente. Casada há um ano com o companheiro que conhece desde os 14 anos, Thayná precisou interromper seus planos profissionais e acadêmicos para se dedicar inteiramente aos cuidados da mãe, que havia perdido os movimentos, e do avô, que também enfrentava sérios problemas de saúde. Na época, ela era concursada na prefeitura de Mauá e cursava faculdade de veterinária, uma escolha ligada à sua paixão pelos animais desde criança. No final daquele ano, com a perda do avô e o diagnóstico de infertilidade, Thayná enfrentou uma avalanche de dores emocionais e psicológicas. No ano seguinte, sua mãe sofreu uma parada respiratória e ficou hospitalizada desde então. Foi nesse contexto de luto, tensão constante e responsabilidades que ela começou, ainda que de forma tímida, a encontrar um pequeno alívio através da arte digital, criando peças no Photoshop de forma autodidata para uma página no Instagram.
Com a chegada da pandemia em 2020, a rotina hospitalar ficou ainda mais intensa. Thayná passava semanas inteiras como acompanhante da mãe, enfrentando o isolamento e o medo constantes do COVID-19. Foi nesse momento que a terapia entrou em sua vida de forma transformadora. Sua psicóloga sugeriu a arte terapia como ferramenta para ajudá-la a lidar com o excesso de controle e ansiedade. A proposta era simples e simbólica: usar a água da aquarela para aprender a deixar fluir, aceitar o imprevisível. A partir desse desafio terapêutico, Thayná começou a experimentar a aquarela no papel. Entre erros, descobertas e estudos online gratuitos, foi se encantando especialmente pela pintura de retratos de animais. Esse encontro com a aquarela se revelou não apenas como um passatempo, mas como uma linguagem emocional. Pintar se tornou um refúgio, um espaço onde ela podia se sentir livre, aliviar a ansiedade e, aos poucos, redescobrir sua identidade.
Em 2024, Thayná foi diagnosticada com autismo nível 1 de suporte — anteriormente conhecido como síndrome de Asperger — e com superdotação e altas habilidades. Esse diagnóstico trouxe alívio e compreensão sobre si mesma, explicando muitas de suas sensibilidades e formas singulares de ver o mundo. Nesse mesmo ano, ela realizou uma série de pinturas em homenagem aos 70 anos de Ribeirão Pires, cidade com a qual possui profunda ligação emocional. Cada paisagem retratada era escolhida por sua história pessoal: o Parque Oriental, onde seus pais se casaram e ela começou a namorar; a estátua de São José, que remete ao período escolar no Sesi. Para Thayná, pintar lugares não é apenas representar o espaço físico, mas trazer à tona as memórias, afetos e camadas invisíveis que existem por trás da imagem. Sua arte, embora realista, carrega alma, sentimento e conexão profunda com as histórias que escolhe contar.
E quando tudo parecia caminhar bem em sua produção artística, a vida a surpreendeu com o que ela chama de milagre: após sete anos tentando engravidar, passando por tratamentos e enfrentando o diagnóstico de infertilidade, Thayná engravidou naturalmente. A gestação, de alto risco, exigiu dedicação total à maternidade, o que a afastou temporariamente das telas e pincéis. Mas mesmo esse período foi mais uma etapa de transformação. Com a chegada do bebê, Thayná se viu ainda mais conectada à sua essência. Agora, retornando lentamente à pintura, ela carrega em si uma nova potência criativa, alimentada por tudo o que viveu.
Apaixonada por animais desde sempre, o amor pela veterinária nunca a deixou, e hoje se expressa através de cada olhar que ela retrata em seus quadros. Seus animais ganham vida e emoção, como se carregassem sentimentos no olhar, algo que ela se esforça genuinamente para transmitir. Ao mesmo tempo, o contato com a natureza e a espiritualidade também está muito presente em suas obras. A pintura, para Thayná, é mais do que técnica: é um gesto de alma, uma conversa silenciosa entre ela e o mundo. Após a morte de sua mãe, a arte se tornou uma forma de silenciar a mente e acalmar o coração. E assim ela segue, pintando com profundidade e verdade, compartilhando, através da aquarela, aquilo que não cabe em palavras.
Rafael Marques